
Cinco de março de 2020 amanheceu como qualquer dia normal, talvez mais ensolarado do que o habitual naquele fim de inverno, mas, para lá disso, nada indicava a importância que esse dia viria a ter. Isto porque 5 de março de 2020 foi o último dia em que vivi a 100% a vida académica. O dia da última festa, o dia da última praxe, o dia do último jantar com amigos, um dos últimos dias de aulas presenciais.

A última vez…
É estranho pensar em todas estas coisas que fiz pela última vez, sem ter consciência de que passado uns dias o mundo ia tornar-se num lugar surreal. Pensar em como entrei numa sala de aula sem me preocupar com desinfeções, com os meus amigos à minha beira, sem distanciamento. Saber que voltei a casa tão frustrada e tão zangada, no final de um dia de praxe que não tinha corrido tão bem. Pensar, apesar disso, nos sorrisos e memórias que essa tarde ainda assim me trouxe. E pensar na pizza que queimámos ao jantar, na preparação para a festa, no nervosismo de quem ia fazer um pedido de apadrinhamento. Pensar em todos os abraços e em todos os encontros. Nas bebidas partilhadas e nas danças atabalhoadas. E nas despedidas…
E pensar que nesse dia eu, na minha inocência, disse, ao jantar, “Daqui a dois meses, por esta hora, já não somos caloiros”. Porque o dia 5 de maio de 2020 era o dia do meu primeiro cortejo.

Mas dois meses depois, não houve cortejo nem passei a tribuna. Não houve monumental e a minha madrinha não me traçou a capa. E eu não trajei com o meu ano e não chorei abraçada a todos eles. Não houve imposição, nem hino de curso berrado no bar. Ou nos autocarros da queima. Dois meses depois, só houve caras presas em pequenos quadradinhos no ecrã e micros que não ligam quando devem.
Uma vida académica por cumprir
E desde então que vivemos assim. Substituímos as tardes no jardim e os warm-ups na Cordoaria por chamadas intermináveis, a jogar os jogos mais aleatórios de sempre. Não são substitutos perfeitos, mas dão um quentinho no coração que ajuda a enfrentar o stress das aulas online.
E quanto ao espírito académico… Anda adormecido, esquivo, mais apagado. Mas nunca morto! Porque enquanto houver quem dele sentir saudades, quem se emocionar a ouvir um fado, quem tiver vontade de partilhar este sentimento com aqueles que chegam desorientados a este mundo novo, o espírito académico não morrerá, por mais que as perspetivas de futuro sejam poucas.
Que tu, que estás a ler este texto, sejas essa pessoa que não deixa o espírito académico morrer, que procura alternativas e soluções, que continua a emocionar-se com um fado e a fazer chamadas com os amigos.
Sempre, sempre, com muito juízo e noção!