
Participar no programa Erasmus é um sonho para muitos estudantes, mas como será que estes tempos de pandemia afetaram o programa, criado em 1987? Para descobrir isso, a Rede conversou com três alunos e ouviu as suas perspetivas sobre o Erasmus em tempo de pandemia.
Sabemos que o setor da cultura está arrasado, que a economia está tremida, que o desemprego aumentou significativamente. Mas, como está o Erasmus? Os alunos continuam a querer viajar para outros países? Ou têm medo do vírus e resguardam-se nas suas zonas de conforto?

Segundo a Agência Nacional Erasmus+, no primeiro semestre deste ano letivo, houve uma quebra de 68% no número de alunos portugueses a estudar em universidades estrangeiras. Portanto, o impacto da pandemia é evidente! No entanto, há quem mantenha a vontade de estudar noutro país, e, por isso, conversámos com três alunos que se focam nas oportunidades e nunca nas adversidades impostas pela vida, neste caso pela pandemia.
De Rennes a Lisboa
Há quem tenha sido apanhado de surpresa pelo vírus. Afinal, a Covid chegou à Europa tão rápido como se espalhou. E, numa questão de dias, interferiu na vida dos estudantes, e, nalguns casos, em alguns dos seus sonhos.
Este foi o caso de Valentim Pereira. Um estudante francês, com 22 anos, filho de pai português, que sempre sonhou morar em Portugal. Quando era pequeno, em alguns verões, viajou com os pais até à pequena aldeia da família paterna, na região de Trás-os-Montes e Alto Douro. Rapidamente se apaixonou pela cultura portuguesa. Mais tarde, ainda com o brilho nos olhos, que refletia o amor por Portugal, decidiu fazer Erasmus no 1º ano de mestrado em Strategic & Digital Marketing, no Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade de Lisboa (ISEG).

Em fevereiro de 2020 aterrou na capital, repleto de liberdade e com vontade de se misturar na vida portuguesa. Mas, no mês seguinte viu-se confinado em casa, longe da família e dos amigos.
Perdi a vida social! A maioria dos estudantes estrangeiros e os meus amigos voltaram para casa em março.” Valentim Pereira
No entanto, Valentim Pereira ressalta a importância da experiência: “aprendemos a adaptar-nos e a enfrentar as dificuldades do dia a dia”, e revela que a faculdade “foi muito acolhedora com os estudantes estrangeiros e administrou muito bem os alunos graças aos cursos à distância e aos professores sempre disponíveis para ajudar”.
Apesar das restrições impostas e da frustração de não poder usufruir da vida académica e da experiência Erasmus a 100%, Valentim afirma ter vivido os seis meses ao máximo possível, valorizando a componente cultural e a importância da experiência para o desenvolvimento pessoal.
Em conclusão, e num tom animado, Valentim avaliou a sua experiência dizendo que “os seis meses foram especiais, e, apesar da Covid, consegui atingir os meus dois objetivos: aprender português e morar em Portugal”. Com um amor desmedido pelo futebol português, acrescentou: “tudo acabou da melhor forma com o F.C. Porto campeão”

Valentim regressou a França em julho de 2020, com a mochila repleta de experiências, não as que idealizou, mas as que lhe foram permitidas. Afinal, conquistou os seus objetivos! E isso foi possível graças ao Erasmus, mesmo em tempo de pandemia!
De Bragança a Varsóvia
Se, por um lado, Valentim foi apanhado de surpresa pelo vírus, por outro lado, Francisco Sousa, de 23 anos, no 2º ano de Gestão de Negócios Internacionais, a estudar no Instituto Politécnico de Bragança (IPB), abraçou a experiência Erasmus e viajou para Varsóvia já tem em tempo de pandemia. Aliás, para Francisco, não foi só a necessidade de aventura que o motivou a avançar com a ideia de fazer Erasmus, mas, também o próprio confinamento.
Em fevereiro de 2021, um ano depois do primeiro lockdown, aterrou em Varsóvia, na Polónia, com a máscara no rosto, mas com os olhos atentos a cada novidade daquele país. Despediu-se da sua zona de conforto e entregou-se à experiência de viver noutra realidade cultural, embora com a mesma realidade pandémica.
“Acho que a minha família só acreditou que eu vinha para a Polónia no dia em que vim, até lá, achavam que era uma maluqueira qualquer!” Francisco Sousa
Sem medo de arriscar, e com a vontade de estudar noutro país, instalou-se em Varsóvia. Se não fosse a pandemia, que o obriga a ficar confinado na casa que arrendou para os seis meses de Erasmus, iria caminhar pelos corredores da Helena Chodkowska University of Technology and Economics (UTH), provavelmente meio perdido nos primeiros dias, à procura das salas de aula. No entanto, tal como em Portugal, as aulas ainda não são presenciais!

Passados dois meses, mas ainda com muito tempo pela frente, Francisco sente-se confortável em Varsóvia. O seu único receio é “do sistema de saúde polaco e de como funciona, caso precise”, mas pensa “que é mais por não o conhecer”.
Apesar de Francisco não poder contar muito mais, uma vez que está há pouco tempo de Erasmus, deixa um conselho aos estudantes que querem aventurar-se no estrangeiro, e afirma que “a pandemia não é impedimento de nada! Basta cumprires tudo o que o governo do país que te recebe diz.”
Com uma boa disposição em toda a conversa, acrescentou: “aproveitem e divirtam-se o máximo que consigam, criem memórias, façam amigos e não se esqueçam, usem a máscara em sítios públicos (risos)”.

A mochila de Francisco ainda não está repleta de memórias, mas, com o seu sentido aventureiro não há dúvidas que até as costuras vão romper. E isso será possível graças ao Erasmus, mesmo em tempo de pandemia!
De Lisboa a Padova?
O Valentim fez Erasmus no primeiro confinamento. O Francisco está a fazer agora, neste momento, enquanto estás a ler este artigo. E, para aqueles que (como tu) querem estudar no estrangeiro no próximo ano letivo?
Marta Damásio, 28 anos, é um exemplo dessa vontade. Está no 3º ano de Psicologia, na Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa (FPUL), e já pensa em fazer Erasmus em Itália, Padova, no seu primeiro ano de mestrado.
Marta não coloca sequer a hipótese de não ir, a não ser que lhe neguem a viagem. Está decidida e, quanto a isso, não há volta a dar. O apoio da família na sua formação também é essencial, que, segundo a própria, nunca a impediu de fazer Erasmus, mesmo considerando a situação atual.
Antes, já havia feito Erasmus na Universidade de Antuérpia, na Bélgica, mas no 3º ano de outra licenciatura: Estudos Gerais. Além disso, ocorreu em situação normal, ou seja, sem a existência de uma pandemia.

No entanto, relativamente ao próximo Erasmus, Marta não se concentra na comparação de uma experiência sem pandemia e de uma experiência com pandemia. As suas atenções direcionam-se na componente cultural e no impacto que essa vivência pode ter no seu futuro profissional.
“Irei sempre ganhar ao nível da formação e a nível pessoal. Estarei a estudar e a aprender com pessoas (professores e pares) com um background muito diferente do meu e, além disso, estarei a viver de uma forma mais independente do que se estivesse em Portugal.” Marta Damásio
A pandemia pode criar algumas incertezas no teu percurso académico e, às vezes, pode obrigar-te a dar passos atrás, ou a ponderares em alguns aspetos. Contudo, e considerando as palavras de Marta, “sejam responsáveis, mas não deixem de viver, de investir em vocês próprios”.
Marta Damásio, com experiência em Erasmus e com vontade de voltar a estudar no estrangeiro, conta-nos as mais valias desta experiência: “terão a possibilidade de se independentizar um pouco, terão acesso direto a outras formas de pensar, terão oportunidade de repensar as vossas ideias, de continuarem a desenvolver sentido crítico e de se tornarem no rascunho daquilo que querem verdadeiramente ser enquanto indivíduos”.

A mochila da Marta ainda não está pronta, mas já conhece o seu destino. Afinal, ainda tem resquícios de Antuérpia, dos momentos que lá viveu e das suas aprendizagens na sua memória.
Como disse o ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, o Erasmus “aumenta automaticamente a tua capacidade de empregabilidade, mas também a tua consciência de ser europeu”. No fundo, é o que estes estudantes procuram: viver a vida, pensar no seu futuro, e desenvolver a mente — rasgando-a com cultura, ética, sabedoria, experiência.
E, acima de tudo, sem medo do que se passa no mundo, mesmo que o mundo seja uma pandemia!